O grupo parlamentar da UNITA, o maior partido da oposição que o MPLA ainda permite que exista em Angola, manifestou hoje “bastante preocupação” com o elevado índice de criminalidade em Angola, com destaque para a capital do país, Luanda.
Numa nota de imprensa, o grupo parlamentar da UNITA destaca entre as ocorrências criminais efectivos da Polícia Nacional que têm sido afectados no cumprimento da sua missão de garantir a segurança dos cidadãos.
“O grupo parlamentar da UNITA lamenta e condena o sucedido e junta-se à dor das famílias enlutadas, apresentando os seus sentimentos de profundo pesar”, salienta-se na nota.
As estruturas castrenses são instadas a melhorarem as condições de trabalho dos efectivos da corporação para a protecção das suas vidas.
“O grupo parlamentar da UNITA exorta a todos os cidadãos a respeitarem e protegerem o bem que é a vida e a dignidade da pessoa humana”, lê-se no documento.
No último fim-de-semana, foi partilhado nas redes sociais por um deputado o suposto rapto do seu filho, tendo sido abordado por um homem armado, que entrou no seu carro e o obrigou a arrancar.
Num outro vídeo, o mesmo deputado surge a anunciar o aparecimento do seu filho, depois de quatro horas do seu sequestro.
Uma outra informação dá conta da morte de um agente da Polícia Nacional, o segundo caso em menos de uma semana, no sábado, vítima de disparos numa troca de tiros, quando tentava frustrar o assalto a uma viatura de uma empresa, que transportava uma elevada quantia monetária.
Recorde-se que o comandante-geral da Polícia, Paulo de Almeida, admitiu no dia 26 de Outubro de 2018 que vários agentes policiais praticam “burlas, falsificações e extorsões a cidadãos”, prometendo combater as “batatas podres” no seio da corporação.
Ainda bem que, ao que parece, os chefes não armazenam “batatas podres”. Isto, é claro, se não forem generais a trabalhar na Casa de Segurança do Presidente da República… Ou será que há? Recorde-se que Paulo Gaspar de Almeida é arguido num processo que está a ser apreciado pelo Tribunal Supremo.
O comissário-chefe Paulo Gaspar de Almeida, foi constituído arguido (processo n.º 16/17-DNIAP) por esbulho violento de uma quinta de 12 hectares, em posse do camponês Armando Manuel, de 71 anos, há 40 anos. A disputa com o então segundo comandante-geral da Polícia Nacional remonta a 12 de Dezembro de 2016.
Um despacho do procurador-geral adjunto da República, Domingos Baxe, atesta que “existem nos autos indícios mais que suficientes que o participado Comissário-Chefe Paulo Gaspar de Almeida cometeu o crime de abuso de poder (…) razão pela qual deveria ter sido constituído arguido e ouvido em auto de interrogatório”.
Segundo Paulo de Almeida, que falava em Outubro de 2018 durante uma formatura dos efectivos da corporação no âmbito da “Operação Resgate”, pelo menos um efectivo da polícia angolana, em média, e “a coberto da farda”, envolve-se diariamente em acções criminais.
Paulo de Almeida lembrou que a operação policial iria estender-se a todo o país, visava essencialmente o “resgate do civismo, da ordem, da conduta sã e da dignidade”, pelo que “a ordem deve começar no seio da polícia”, reconhecendo que vários agentes praticam “burlas, falsificações e extorsões a cidadãos”.
Discursando perante milhares de efectivos da Polícia, em cerimónia que teve lugar no Instituto Superior de Ciências Policiais e Criminais de Angola, em Luanda, e sem especificar números, Paulo de Almeida manifestou-se “preocupado” com número de agentes da polícia envolvidos no crime.
“Estou preocupado com o número de polícias envolvidos em acções criminais. Todas as semanas, para não dizer dias, registamos a participação de um ou outro agente da polícia envolvido em acções criminais. Isso tira-nos a autoridade”, lamentou.
“Retira a nossa capacidade, frustra a nossa acção. Quero aqui dizer que, em representação de toda a polícia do país, temos de combater essas batatas podres no nosso seio”, adiantou Paulo de Almeida.
O comissário-geral da Polícia assegurou mesmo a necessidade de “neutralizar agentes que, a coberto da farda, cometem diariamente crimes diversos”, apelando à “vigilância” aos agentes da polícia e à sociedade para que “denunciem essas práticas”.
Para Paulo de Almeida, se a Polícia Nacional tenciona impor a ordem é necessário, inicialmente, que os efectivos da corporação que tutela “sejam ordeiros e disciplinados para que a operação decorra sem máculas”.
“Não queremos realizar uma operação com essas manchas no nosso seio. É preciso que cada um seja o vigilante do outro, é preciso que cada um identifique e denuncie aqueles que estão com comportamentos marginais no nosso seio. É preciso ganhar e resgatar a confiança da população à polícia nacional”, exortou o oficial superior.
Durante a sua intervenção, o comandante geral da Polícia disse que há elementos da corporação que se dedicam à “burla e à falsificação”, considerando que os “batuqueiros e penteadores” serão “banidos da corporação”.
“Não é a extorsão ou o crime, que vos vai (efectivos da Polícia) dar glórias ou oportunidades. As grandes glórias vão sair do vosso empenho e desempenho”, realçou.
Ciente das dificuldades que a Polícia ainda enfrenta, como a carência de “infra-estruturas, de meios de locomoção e dificuldades técnicas e logísticas”, Paulo de Almeida admitiu que as dificuldades “não serão superáveis a curto prazo”.
“Mas a nossa firmeza e determinação vai fazer com que nós ultrapassemos isto. Sem esforço não haverá êxitos na nossa missão”, assegurou.
Ainda (e sempre) Cafunfo
O advogado do líder do Movimento do Protectorado Português Lunda Tchokwe (MPPLT), José Mateus “Zeca Mutchima”, denunciou hoje que o seu cliente “está preso ilegalmente”, após terem sido ultrapassados os 120 dias de prisão preventiva.
Segundo Salvador Freire, à luz do novo Código Penal angolano, Zeca Mutchima, detido em 8 de Fevereiro, “já cumpriu os 120 dias de prisão preventiva e neste momento está preso de forma ilegal”.
“Mais do que nunca o Zeca Mutchima já deveria estar em liberdade, mas, infelizmente, não sabemos por que questões ele continua detido. Insistimos que a Procuradoria já deveria mandar a sua soltura porque os prazos de prisão preventiva venceram”, afirmou hoje o advogado.
Salvador Freire referiu que o prazo de prisão preventiva terminou no dia 9 deste mês, considerando estar-se diante de uma “denegação de justiça”, o que se configura, referiu, em “um crime”.
Indiciado pelos crimes de “associação de malfeitores e rebelião armada”, na sequência os incidentes de 30 de Janeiro em Cafunfo, que resultaram em mortos e feridos, Zeca Mutchima está detido pelo Serviço de Investigação Criminal (SIC) em Luanda, desde 8 de Fevereiro passado.
Segundo a polícia angolana, cerca de 300 pessoas ligadas ao MPPLT, que há anos defende a autonomia daquela região rica em recursos minerais, tentaram invadir, na madrugada de 30 de Janeiro passado, uma esquadra policial de Cafunfo, província da Lunda Norte, e em defesa as foras de ordem e segurança atingiram mortalmente seis pessoas.
A versão policial é contrariada pelos dirigentes do MPPLT, partidos políticos na oposição, sociedade civil local e organizações internacionais que falam dezenas de mortos.
Zeca Mutchima é apontado pelas autoridades como cabecilha deste alegado “acto de rebelião” que para os cidadãos locais era uma “manifestação pacífica”.
Hoje, Salvador Freire voltou a lamentar igualmente a “ausência de informações concretas” do SIC sobre a permanência de Zeca Mutchima em Luanda, referindo que os agentes do SIC Luanda “também estão preocupadíssimos com a situação”.
“Porque acham que alguma coisa não está a andar bem a nível da província da Lunda Norte (palco dos incidentes de Cafunfo)”, frisou.
“Não sabemos se há ordens superiores ou não para que Zeca Mutchima continua detido, portanto isto é contra os princípios da dignidade da pessoa humana e efectivamente o Estado está a violar os direitos de Zeca Mutchima”, rematou Salvador Freire.
Folha 8 com Lusa